16 de junho de 2007




Você está à beira do quê?

(texto de Martha Medeiros, O Globo – 28/jan/07)



Se você responder à pergunta acima dizendo que está à beira de um ataque de nervos, não será uma resposta original, mas pode muito bem ser verdade, já que poucos conseguem ficar tranqüilos diante desta rotina surreal em que nos meteram. Trancar portas, gradear janelas, acionar alarmes, desconfiar de todos — que vida excitante. Eu, ao contrário de me enervar, estou à beira de ficar zen. Basta apenas parar de ler os jornais, de ver TV, desconectar o computador, vender meu carro, doar meus bens e me mudar para o Tibete. Você também não sente vontade, às vezes? Eu de segunda a domingo.



À beira de algo. A maioria das pessoas — as desassossegadas por natureza — está a ponto de dar uma guinada, está prestes a tomar uma atitude, está ali ali para enfrentar uma ruptura. Poucos estão 100% conformados. Os que têm o costume de se questionar ao menos meia-hora por dia já podem se considerar no limiar de fazer uma manobra radical: são habitantes do planeta Quase.



Alguns, por exemplo, estão quase desistindo de manter sua empresa funcionando. Estão cansados de pagar tantos impostos, de sofrer ações trabalhistas injustas, enfraquecidos pela concorrência que só cresce. Estão quase falindo, mas lutando. Quase desistindo, mas ainda sem coragem de abrir mão de tudo.



Outros estão quase saltando fora de um casamento, quase convencidos de que é melhor sofrer fora do que dentro dele, por pouco não trocando de lado, apenas aguardando o tal “momento certo”, que é a coisa mais difícil de identificar.



Em contrapartida, tem gente assinando a papelada para abrir um negócio próprio e outros tantos com a data de casamento marcada. Não importa a ruptura que se dará (mudar de condição de vida é sempre uma ruptura): tudo o que nos aguarda ali adiante é um enorme e imponente ponto de interrogação.



É como se o mundo fosse dividido em duas partes, com um rio passando no meio.



Estamos sempre de olho na outra margem deste rio, no que existe do lado de lá. E é desta sensação de incompletude — não podemos estar nos dois lados ao mesmo tempo — que surge tudo o que existe. A arte, por exemplo. Cinema, literatura, música, teatro e dança são formas de fazer esta travessia. Também desta sensação de incompletude surgem os relacionamentos amorosos: uma vontade de trazer para nossa vida alguém com uma experiência diversa, alguém que nos traga a informação do “estrangeiro” e que amplie nossa cidadania, enriqueça nossa existência. Da incompletude, ainda, vêm os desejos: tentar outra atividade, visitar outros países, escalar uma montanha, saltar de pára-quedas, virar budista, escrever um livro.



Estamos sempre na iminência de. Tentados a. Seduzidos por.



Você está à beira de quê? Sabe, sim. Só não quer contar

Eu hj to me sentindo SÓ

beijos e bom finds

dr x

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